segunda-feira, 12 de setembro de 2011

A ARQUITETURA DO 11/9

A arquitetura pode brotar dos mais insólitos eventos na história da humanidade, até dos mais trágicos. Os esforços de reconstrução, em decorrência dos atentados de 11/9, começam a se materializar dez anos depois, e assumem papel de destaque no cenário da arquitetura contemporânea.
As torres gêmeas do World Trade Center foram alvo dos extremistas da Al Qaeda, assim como seu arquiteto, Minoru Yamasaki, foi alvo dos pós-modernistas radicais, que decretaram o fim do movimento moderno a partir da demolição do Conjunto Pruitt-Igoe, em 1955, de sua autoria.
O arquiteto faleceu em 1986, sem presenciar o desaparecimento de sua obra prima e a empresa que ele fundou, Yamasaki & Associates, fechou as portas há apenas dois anos atrás, vítima do colapso no setor imobiliário americano, mas, com certeza, desde muito antes o moral da equipe não era mais o mesmo.
Este texto aborda o fascinante empreendimento que resultou desse odioso gesto, fruto do fanatismo religioso.
Criada em julho de 2002, a Lower Manhattan Development Corporation, tem como objetivo a reconstrução dos edifícios, o incremento à ocupação da zona sul da ilha e a perpetuação da memória dos mortos nos ataques.
Após o descarte das propostas iniciais de conhecidos arquitetos de todo o mundo, que se uniram em equipes para projetar o novo complexo, em 2003, o plano diretor de Daniel Libeskind foi escolhido. Desentendimentos com o arrendatário Larry Silverstein levaram à contratação de consagrados escritórios para a elaboração dos projetos das novas torres. O arquiteto Michael Arad foi o vencedor do concurso para o projeto do memorial, entre 5.200 inscritos e o paisagismo ficou a cargo de Peter Walker, que se juntou à Arad na etapa final da competição, a fim de “humanizar” a proposta.
A seguir, os projetos um a um:
World Trade Center 1: David Childs, Skidmore, Owings and Merrill. Também chamada de Liberty Tower é a mais interessante. A planta quadrada no embasamento se transforma gradativamente em octogonal, gerando planos e arestas onde podemos observar várias referências: uma variante simples do projeto de Libeskind para o edifício principal, a escala proeminente das torres destruídas, o perfil de obelisco, e a re-edição da Estátua da Liberdade. A grande antena paira acima do skyline, marcando o ressurgimento do complexo.
World Trade Center 2: Foster and Partners: podemos reconhecer o respeito ao plano original, o edifício é uma composição de quatro prismas de topo chanfrado interligados em planta por um core de forma cruciforme. Apesar da implantação forçada pela conformação do lote, o ático parece fazer reverência à praça. Com certeza remete ao maciço bloco único proposto por Foster em 2002 e à Torre Hearst, também em Nova York.
World Trade Center 3: Rogers, Stirk, Harbour and Partners. Apesar de pregar o oposto, o projeto de Rogers foge do esquema de Libeskind pelo volume monolítico levemente escalonado, pelo exoesqueleto estrutural e pelo coroamento composto de quatro antenas, que lembram o edifício PPG, de Philip Johnson. É favorecido pela orientação diretamente frontal à praça. Aparentemente, a contratante Silverstein Properties apostou no confronto direto dos lordes ingleses em solo americano.
World Trade Center 4: Maki and Associates. Talvez a disciplina e a personalidade dos japoneses, muitas vezes avessos ao star system da arquitetura tenham se refletido nesse projeto. O prédio de Fumihiko Maki é um volume simples, seccionado na porção superior, que se volta diretamente para a praça e à torre 1. O respeito ao plano diretor é evidente, e podemos concordar com o autor quando diz que o resultado denota quietude e dignidade.
Memorial: sem dúvida, o conjunto “Reflecting Absence” é o que mais chama atenção. Apresenta uma incrível carga poética, ao mesmo tempo dramática, talvez só comparada ao Memorial dos Judeus Mortos de Peter Eisenman em Berlim. Os espaços vazios, as quedas e os espelhos d’água simbolizam de maneira incontestável o triste acontecimento que marcou a história contemporânea.
Pavilhão do Memorial e Museu do 11 de Setembro: Snøhetta. O projeto do escritório norueguês tem como função abrigar e conduzir o visitante ao museu, logo abaixo. O volume rompe com a horizontalidade da praça, induz a circulação, e a transparência parcial das fachadas permite a penetração da luz solar nos níveis inferiores. A presença de dois “tridentes estruturais” remanescentes da torre sul recorda as imagens marcantes dos primeiros dias após o desabamento.
Museu Nacional do 11 de Setembro: Davis Brody Bond, atualmente trabalhando em sociedade com Aedas: o projeto tira partido do subterrâneo do sítio, tem enorme impacto o muro de contenção preservado e emprega vários elementos remanescentes do período de escavação, e das homenagens prestadas pelos parentes dos mortos e pelo povo de Nova York. Cabe lembrar que o subsolo do complexo foi alvo de outro atentado, em 1993, igualmente executado pelos terroristas de Osama Bin Laden.
Hub de Transporte: Santiago Calatrava. Desta vez, o pássaro aterrissou entre as “torres britânicas”. A estrutura simétrica é levemente rotacionada em relação aos volumes vizinhos, as “asas” se apóiam, liberando a planta ao nível do pavimento térreo configurando a “gare”. A referência à Estação Lyon-Satolas é imediata.
Performing Arts Center: Frank Ghery, ainda sem dotação orçamentária completa, o estudo preliminar apresentado revela o arquiteto em busca de novos caminhos. Desperta curiosidade saber como um programa que exige amplos espaços foi distribuído numa série de sólidos empilhados “morro acima”.
Concluindo, o empreendimento poderia se tornar o mais novo desfile de vaidades da arquitetura mundial, mas antes disso, é um marco da arquitetura do nosso tempo, um símbolo da superação e do renascimento, e a perpetuação da memória de um dos mais lamentáveis acontecimentos provocados pelo ódio dos homens contra os homens.
Seria também o caso de imaginar o que teria acontecido na capital americana, além da destruição de parte do Pentágono, caso os bravos passageiros não tivessem conseguido dominar os seqüestradores do vôo United 93, que acabou caindo numa fazenda da Pensilvânia, e que tinha como destino o prédio do Capitólio.